A proposta de reforma da Previdência aprovada em primeiro turno na Câmara dos Deputados pode cortar o acesso de 12,7 milhões de trabalhadores ao abono salarial. A exclusão atingirá 54% dos 23,7 milhões dos atuais beneficiários do programa, que assegura hoje o valor de um salário mínimo anual aos trabalhadores que recebem, em média, até dois salários mínimos de remuneração mensal de empregadores que contribuem para o PIS/Pasep.
Com a proposta de reforma aprovada na semana passada, que ainda depende de votação em segundo turno na Câmara e mais dois turnos no Senado, o abono será concedido para quem ganha até R$1.364,43 - valor calculado pelo critério previsto na Constituição que define a condição de baixa renda.
Os cálculos foram feitos pelo economista do Daniel Ferrer, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a pedido da Federação dos Trabalhadores da Indústria Química e Farmacêutica do Estado de São Paulo. De acordo com o levantamento, em Estados com salários mínimos regionais próprios a exclusão pode alcançar 72% dos atuais beneficiários, como é o caso de Santa Catarina. Em São Paulo, afetaria 70,1% dos trabalhadores que recebem o abono no Estado - o equivalente a 4 milhões de pessoas.
A proposta inicial de reforma enviada pelo governo Jair Bolsonaro ao Congresso limitava o direito ao recebimento do abono salarial aos trabalhadores cuja remuneração mensal média tivesse sido de até um salário mínimo. Na prática a proposta inviabilizava o recebimento do abono para 94% dos trabalhadores atualmente beneficiados, mas o relator da proposta, Samuel Moreira (PSDB-SP), subiu a linha de corte para R$ 1.364,43.
Apesar dos destaques apresentados em plenário na tentativa de remover essas barreiras à concessão do benefício, o texto foi aprovado na Câmara tal como proposto pelo relator, garantindo uma economia de R$ 76,4 bilhões em 10 anos para as despesas do governo.
Para o relator, houve avanços no texto na direção de proteger os trabalhadores de mais baixa renda. “Procuramos melhorar a PEC que recebemos, procuramos promover avanços. Tivemos resultado”, disse Moreira. O deputado, porém, defendeu que o abono seja rediscutido pelo governo e os recursos economizados transferidos para programas que atendam à população mais carente.
“Essa é uma das partes nefastas da reforma da Previdência, que exclui milhões de trabalhadores ao direito do abono e, consequentemente retirará o direito de 12,7 milhões de trabalhadores”, disse Sérgio Leite, da Força Sindical.
Procurada, a Secretaria de Previdência do Ministério da Economia avaliou que a economia decorrente da maior “focalização” da política do abono pode ser destinada a políticas que realmente estimulam o emprego formal.
O benefício do abono, cujo desenho atual tem origem na Constituição Federal de 1988, visava à complementação de renda dos trabalhadores formais de baixa remuneração, com rendimento médio mensal de até dois salários mínimos. O objetivo declarado da política era o da redução da pobreza e diminuição da desigualdade entre os trabalhadores de mais baixos salários. O poder de compra do salário mínimo na época de sua regulamentação em 1990, era substancialmente inferior ao do salário mínimo vigente desde 2010. O salário mínimo em dezembro de 2018 tinha poder de compra quase três vezes superior ao vigente em dezembro de 1990.
A consequência direta disso, destaca a secretaria, é que 51,7% dos trabalhadores formais recebiam até dois salários mínimo em 2017 (último dado disponível), ante 27% em 1990. Por outro lado, os trabalhadores formais de rendimento realmente baixos no mercado de trabalho (até um salário mínimo) sempre representam entre 5,5% e 6% dos trabalhadores formais, mesmo nos períodos de maior pujança econômica e baixo desemprego.
Segundo a secretaria, os R$ 16,7 bilhões gastos com o abono em 2017 foram concentrados naqueles que ganharam mais de um salário mínimo por mês. Para o governo, o que a Nova Previdência propõe nada mais é do que reafirmar os objetivos originais da política do abono de redução da pobreza e da desigualdade no mercado de trabalho, só que com mais foco e mais eficiência.
Por Agência Estado