(Foto: Divulgação)
BRASÍLIA - A operação
que levou à prisão um dos donos da JBS
,
Joesley Batista
, além dos executivos Ricardo Saud e Demilton de Castro, parlamentares,
dois ex-ministros da Agricultura, um deles o atual vice-governador de
Minas, Antonio Andrade, nesta sexta-feira, tem como base a delação do
doleiro Lúcio Funaro
, que detalhou como funcionava um esquema de propina dentro do
Ministério da Agricultura. O esquema teria contado com a participação do
ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha na compra de apoio de políticos
mineiros e uma inusitada situação no qual um dos ex-ministros teria
"passado a perna" no então deputado João Magalhães na hora de dividir a
propina.
Em 2014, o então ministro do governo da presidente Dilma Rousseff pediu e
recebeu, segundo Funaro, uma propina de R$ 25 milhões da JBS para
favorecer as empresas do grupo.
Segundo a delação do doleiro, o grupo empresarial teria pago R$ 2
milhões para conseguir a regulamentação da exportação de miúdos e
despojos bovinos, além de R$ 5 milhões para aprovar a proibição do uso
da ivermectina (um veneno de longa duração).
Funaro operacionalizou os repasses. O pagamento foi feito no período
eleitoral de 2014, através de doação oficiais de campanha ao MDB e
pagamento de fornecedores indicados por Andrade. O caso também foi
detalhado na delação de Joesley Batista.
Propina de Contrapartida
Segundo Funaro, no início de 2014, um dos donos da J&F, o empresário
Joesley Batista, e o executivo do grupo Ricardo Saud “solicitaram
diretamente ao ex-ministro da Agricultura e Antonio Andrade, a liberação
de certos frigoríficos, e proibição de outros, ao direito de exportarem
carne para determinados países, para, assim, beneficiar a exportação da
JBS”.
Andrade teria, segundo Funaro, determinado que um funcionário do
ministério, indicado pelo ex-deputado Eduardo Cunha e pelo próprio
Funaro, tomasse as devidas providências, “através de uma portaria do
ministério, para atender tal demanda”. O serviço, segundo Funaro, teve
um preço: “Em contrapartida, o ex-ministro solicitou propina no valor de
R$ 25 milhões, alegando que precisava de tais recursos para a campanha
de pré-candidato a vice-governador de Minas Gerais.
Os repasses
Ainda segundo Funaro, a propina milionária seria dividida entre o MDB
nacional e o MDB de Minas Gerais, na forma de repasses para candidatos a
deputados federais e estaduais do MDB mineiro. “Os deputados estaduais
auxiliariam na indicação de Andrade para vice na chapa de Fernando
Pimentel na convenção Estadual do PMDB”, disse Funaro.
A propina foi paga por Joesley, já durante o período eleitoral, na forma
de doação oficial de R$ 1 milhão para o diretório do MDB mineiro.
Outros R$ 9,8 milhões foram usados para bancar, via caixa dois,
fornecedores diversos de campanha indicados por Andrade. Outros R$ 15
milhões foram pagos, por meio de doações oficiais de campanha a partir
de um supermercado de Minas Gerais. “Tudo sob orientação de Andrade”,
disse Funaro.
Retrato da propina
Sucessor de Andrade no Ministério da Agricultura, o atual deputado
estadual eleito Neri Geller (PP-MT) teria continuado o esquema de
propinas na pasta. Na própria delação de Joesley Batista, os delatores
relatam um episódio curioso envolvendo uma das entregas de propina.
Florisvaldo Oliveira, ex-executivo da J&F e encarregado de
distribuir as propinas da JBS a políticos, tirou uma foto com o então
ministro da Agricultura, Neri Geller, depois de lhe entregar, em mãos,
R$ 250 mil.
Ao prestar depoimento na delação, Oliveira disse que apresentou seus
documentos na entrada do ministério e que partiu da própria assessoria
da pasta o pedido para que ele e Geller, uma indicação do MDB, posassem
juntos para a foto. Em sua delação premiada, o “homem da mala” da JBS
anexou até um e-mail que recebeu do fotógrafo do ministério com o
registro do encontro. Ele foi enviado no dia do pagamento da propina: 3
de novembro de 2014.
"Tomou um chapéu"
Um áudio recuperado pela Polícia Federal nos gravadores dos delatores da
J&F, o executivo Ricardo Saud, alvo de mandado de prisão nesta
sexta-feira, conversa com o então ex-deputado federal João Magalhães
(MDB-MG) sobre o pagamento de uma propina de R$ 4 milhões que teria sido
prometida a ele, ao vice-governador de Minas, Antonio Andrade, e outros
integrantes da bancada mineira na Câmara. Em setembro de 2014, já
pensando na eleição para a presidência da Casa, o ex-deputado Eduardo
Cunha (PMDB) usou os R$ 4 milhões da sua conta-propina com a JBS para
comprar o apoio de parlamentares mineiros. A bolada seria dividida entre
Andrade e outros parlamentares.
O então deputado João Magalhães levaria parte da bolada, mas ficou com
medo de ser flagrado pela PF com o dinheiro e, nas palavras de Saud,
“tomou um chapéu” de Andrade, que teria recebido a propina pelos dois,
mas não repassou ao colega.
Na conversa, Magalhães reclama que não recebeu a propina, diz que tem
todas as anotações dos acertos “escondidos no gabinete” e que precisa
resolver a situação. O ex-deputado então revela que rompeu com Andrade
porque levou um golpe do colega: “Nós chegamos na Pampulha [o aeroporto
para voos privados em Belo Horizonte]. Eu tava indo para um comício em
[Governador] Valadares, aí a Polícia Federal fica na frente do
aeroporto, você chega com uma mochila cheia de dinheiro?”, diz
Magalhães. “Nós resolvemos tudo. Você tomou um chapéu”, diz Saud ao
ex-deputado.
Por O Globo