Brasil
Publicada em 14/01/24 às 19:37h
Grutas atraem turistas, cientistas e fãs de boas histórias em Vazante e Sacramento

Boa Nova FM

 (Foto: Fabianni Luiz Ribeiro/Reprodução)

Corredores, salões e galerias compostas por rochas sedimentares formadas há mais anos do que se pode contar. Espaços que abrigam ecossistemas inteiros, acontecimentos lendários e, mais recentemente, turistas e pesquisadores de todo o país.

 

A Gruta dos Palhares, em Sacramento, e a Gruta Lapa Nova, em Vazante, são duas formações mineiras e podem ter muitas semelhanças. Contudo, mesmo definidas por adjetivos similares, as rochas separadas por 337 km, são singulares à sua maneira.

 

g1 conversou com pesquisadores e entusiastas das grutas para saber tudo sobre as "pedras" no meio do interior de Minas Gerais. (Com a licença de Carlos Drummond de Andrade, claro!) Leia mais abaixo.

Formações

 

Grutas são cavidades naturais ou aberturas no solo, geralmente formadas por processos geológicos. Minas Gerais é o estado que mais concentra grutas no país. De acordo com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o estado tem 6.184 grutas e cavernas, é o equivalente a mais da metade de todas as formações do Brasil (58,7%).

 

O processo de formação de grutas é bastante variado. Fernanda Cerchi Bonatti, professora de Geografia e agente cultural, explicou que a formação remonta a 140 milhões de anos, durante os períodos jurássico e cretáceo. Nessa época, o Brasil fazia parte do antigo continente Gondwana e tinha um deserto semelhante ao Saara.

 O supercontinente Gondwana unia América do Sul, África, Índia, Antártica e Austrália. — Foto: Reprodução

"A Gruta dos Palhares se formou a partir de uma duna de areia que, entre aspas, se fossilizou, devido aos fluxos de lava da intensa atividade vulcânica na região. Os sedimentos de areia foram se cimentando e deu origem a rocha sedimentar que forma a gruta, o 'arenito'. Ela é oca por dentro devido a erosão causada pela água ao longo do tempo", explicou Fernanda.

 

A ação do tempo gerou uma gruta de 22 m de altura, 480 m de extensão e 38 galerias internas.

 

No caso da Gruta Lapa Nova, a formação também é de rocha sedimentar, composta por camadas alternadas de material pelítico e carbonático. Em Vazante existem outras duas estruturas partes da mesma unidade de conservação gerenciada pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF), onde também estão duas outras cavidades, a Lapa de Gameleira e a Caverna Lapa Nova Sul.

 

"A Lapa Nova tem uma extensão de aproximadamente 45 km de caverna, ou seja, de galerias na somatória total. Porém, a área visitável por turistas se estende por aproximadamente um quilômetro", contou Gilberto dos Reis, gerente da unidade.

 

A limitação ocorre para preservar o ecossistema e o visitante. A área aberta à visitação é uma área que oferece menor risco e os outros 45 km ficam para os pesquisadores, geólogos, mineralogistas e demais profissionais da área acadêmica.

 

"Dentro desse um quilômetro, o visitante vê várias galerias, vários salões, espeleotemas, estalactites, estalagmites... Várias formações que demonstram pouquinho da grandeza da gruta".

Turismo

 

A unidade de conservação da Gruta Lapa Nova, por exemplo, existe desde 2016, quando foi tombado o Monumento Natural Estadual da Gruta Lapa Nova de Vazante. No entanto, o turismo se tornou uma realidade para ambas ainda no século XX.

 A área do Monumento Natural Estadual da Gruta Lapa Nova é de 79,0471 hectare — Foto: IEF/Arquivo

Foi a partir deste momento que o IEF passou a gerenciar o espaço e garantir tanto a preservação, quanto o turismo responsável.

 

"Em média temos um fluxo de visitantes entre 15 e 17 mil pessoas ao ano. O fluxo maior se dá no final do mês de abril e início do mês de maio, que é o período da festa da padroeira da cidade que é a Nossa Senhora da Lapa. Nesse período, o fluxo é muito grande mesmo, passando em torno de 2 mil pessoas por dia", disse Gilberto

 

Fora do período da festa, o principal público são alunos de colégio, curso técnicos e também de faculdades. Gilberto explica que estudantes encaram a unidade de conservação como laboratório a céu aberto.

 

"Eles podem ver ali frente a frente os trabalhos que são mencionados em sala de aula. Então, nós temos por mês em torno de 3 a 4 visitas, com 60, 70 estudantes com esse objetivo, de alavancar um pouquinho o conhecimento que é trabalhado em sala de aula", afirmou.

 

A Gruta dos Palhares, por sua vez, recebe 700 visitantes por semana em média, ou seja, mais de 35 mil visitas ao ano, de acordo com a Secretaria de Turismo de Sacramento. O turismo começou há pelo menos um século.

 

"A gruta fazia parte de uma fazenda da Família Palhares, daí o nome. O que se sabe é que em meados do século XIX ela foi descoberta. Mesmo sendo uma propriedade particular, o pessoal da cidade visitava. Em 1965 a fazenda foi desapropriada e fizeram o Parque Municipal da Gruta dos Palhares", relatou Fernanda.

 

Por serem pontos turísticos, diversas personalidades visitaram as grutas. Em Palhares, entre os mais famosos está Santos Dumont, que assinou uma das paredes da gruta em 1932, antes de falecer. A assinatura de visitantes era comum na época, mas hoje é proibida. De qualquer forma, a assinatura do criador de aviação fica protegida até hoje por um vidro.

 

Em Lapa Nova, a pessoa mais importante a passar por lá foi justamente uma das que ajudaram Vazante a se tornar a Capital Brasileira do Zinco, o mineralogista Ângelo Sólis.

 Ângelo Sólis recebeu título de cidadão de Vazante por seus trabalhos relacionados à minério. — Foto: Acervo/Reprodução

"Ele era do Chile, ele fez parte da expedição do Marechal Cândido Rondon e aprendeu com os indígenas amazônicos a ciência da cura através das ervas e das pedras e tudo mais. Ele veio pra essas terras aqui, para essas terras de Vazante e descobriu o zinco", contou Edyvan Fernando, diretor de Cultura e Turismo do município.

 

Edyvan também destaca as inúmeras formações rochosas que formam as mais diversas figuras.

 

"Elas dão asas a nossa imaginação. Lá têm estalagmites muito características que parecem animais, deuses, pessoas... Tem Poseidon em um ponto, é como se fosse a cabeça de uma pessoa, de um deus com longas barbas e cabelos longos também. As imagens ficam à vista da nossa interpretação, a gruta é toda permeada por essa imaginação popular".

Gruta no interior de MG — Foto: IEF/Arquivo

Lendas

 

Imaginação popular, aliás, é o que não falta quando se fala de grutas e cavernas. Histórias sem precedentes, provas ou razão perpassam os locais. Duas delas podem até ter um fundo de verdade, mas a ação do tempo impediu que algum achado histórico tornasse o dito popular em fato.

 

Em Vazante, por exemplo, existem lendas de pessoas que se escondiam na Gruta da Lapa Nova, devido à Guerra do Paraguai.

 

"As pessoas que não queriam ir para a guerra acabavam chegando aqui tentando fugir. Interessante que nessa época nem se pensava na cidade de Vazante. Existiam fazendas ao redor, nas proximidades daqui", contou Edyvan.

Já em Sacramento, o dito é que nos séculos de escravidão, escravos se refugiavam na Gruta dos Palhares. Esse é consenso entre os pesquisadores.

 

Contudo, a questão deixa de ser a "probabilidade" do fato e passa a ser a "possibilidade" dele. A lenda diz que, em caso de alguma morte de um escravo, o espírito dele se prendia à gruta e lá estão até hoje.

 

Aliás, história de espírito é o que não falta por lá. Como a lenda da noiva de um caixeiro viajante, ou seja, um comerciante ambulante que viajava quilômetros e quilômetros até o início do século XX vendendo todo o tipo de mercadoria.

 

"Diz a lenda que no dia do casamento, a noiva ficou sabendo que o caixeiro era casado em outro lugar. Muito triste, subiu no alto da gruta e ameaçou se jogar. O comerciante tentou impedir, mas ela se suicidou. Há quem diga que se um visitante tirar foto da gruta à noite, a namorada do mercador ainda aparece na imagem", contou Fernanda.

Altar dentro da Gruta dos Palhares exemplifica a relação entre a estrutura e a fé — Foto: Sylvia Bazote/Reprodução

Fonte: G1

 




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